Apesar da dura fase que as varejistas de bens de consumo enfrentam desde o ano passado, há sinais de que o mês de abril e o início de maio foram melhores que o primeiro trimestre, o que vem aumentando as expectativas de alguma mudança no ambiente de consumo na segunda metade do ano. Maior volume de recursos circulando na economia explicaria esse movimento, ainda inicial, de demanda um pouco mais aquecida.
Isso começou a ficar mais claro com a divulgação de resultados das redes nos últimos 20 dias. Apesar de os dados de vendas de janeiro a março mostrarem o que já se esperava – volume de mercadorias vendidas pouco expressivo e custo de produtos em alta – empresas como Via, Centauro e Carrefour citaram um abril melhor do que março em termos de fluxo de clientes. O Magazine Luiza mencionou ontem um abril e maio com bom ritmo. Marisa e Riachuelo identificaram retomada de vendas entre abril e maio frente aos primeiros três meses do ano.
“Não dá ainda pra ‘por em pedra’, mas o consumidor está voltando”, disse o presidente da Via (Casas Bahia e Ponto) Roberto Fulcherberguer a analistas dias atrás. “Estamos bastante animados com o potencial de resultados do segundo trimestre”, afirmou na semana passada Oswaldo Nunes, presidente da Guararapes, que controla a Riachuelo.
A rede de moda apurou alta na receita líquida de mercadorias de 45% de janeiro a março sobre 2021 e com aceleração em abril. Já o grupo Carrefour informou um crescimento em abril de vendas no conceito “mesmas lojas” (pontos com mais de um ano) de cerca de 20% no varejo alimentar.
“Houve efeito da inflação, mas cresceu em volumes também”, afirmou o presidente Stéphane Maquaire, em conferência com analistas. Com o desempenho é possível esperar um nível de margens no curto prazo, pelo menos no mesmo patamar do primeiro trimestre, apesar do ambiente inflacionário, disse o comando.
A Via mencionou que atingiu o melhor Dia das Mães desde 2018. A Americanas, que vende de alimentos à eletroportáteis e itens de cama, mesa e banho, diz que as lojas físicas vêm ganhando fluxo maior e mostram resiliência.
Liberação parcial de recursos do FGTS, estabilização nos índices de desemprego (o trimestre de dezembro, janeiro e fevereiro teve a menor taxa desde 2016) e antecipação de pagamento do 13º salário de aposentados e pensionistas podem ter tido algum impacto nesse quadro, como têm dito alguns economistas. Mas ressaltam que uma retomada em um ou dois meses ainda pode ser frágil, e depende de uma melhora mais robusta em indicadores macroeconômicos e melhor controle inflacionário.
Para as redes, nessa conta há ainda o efeito da chegada do Auxílio Brasil, em valores maiores que o anterior Bolsa Família, assim como aumento na circulação de consumidores nas ruas.
Outro aspecto que chamou a atenção nas apresentações de resultados foi a capacidade de as varejistas de moda repassarem reajustes de preços ao consumidor nos primeiros meses do ano sem uma queda no volume vendido.
O presidente da Renner, Fabio Faccio, mencionou que tem feito esse movimento sem uma reação negativa dos compradores, assim como a diretoria da Centauro diz ter repassado pressões em custos de insumos e moeda estrangeira sem perda de vendas. “Todos os canais da [operação] da Fisia [distribuidora da Nike] tiveram aumento de preços para compensar a variação cambial”, disse a diretoria. A Fisia cresceu 88% de janeiro a março.
Apesar de serem companhias voltadas ao consumidor de classe média, normalmente processos de retomada no consumo se iniciam por esse segmento, e a expectativa de especialistas é que um eventual ambiente de recuperação um pouco mais consistente vá ganhando força em redes para classes de menor renda posteriormente.
Na Marisa, focada na classe C, apesar da queda acentuada de fluxo em janeiro, a rede fala numa “recuperação expressiva” de vendas em lojas com mais de um ano em fevereiro e março, frente aos meses de 2019, e com uma melhoria se repetindo em abril e maio.
Um ponto central que vai ficar no radar do mercado nos próximos meses será a questão do aumento nos atrasos de pagamentos nos financiamentos dados pelas varejistas. É possível que mesmo uma leve retomada na demanda ocorra num ambiente de consumidores com contas em aberto.
Por: Valor Econômico
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